Respeito à minha Hipocrisia!
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Num passado não muito distante, em função de conflitos, rejeitei o que era achando que não era adequado, quis ser
outra coisa... Não deu resultado... Ou melhor: deu, mas não o que esperava...
Houve momentos em que lutei com os meus monstros (assim eu os chamava), e me
achava hipócrita por tê-los. Como podia alguém que já tinha entrado em contato
com alguns conhecimentos tão profundos e transcendentais ainda se submeter a
sentir e desejar certas situações que, a seu ver, não lhe trariam nada de
substancial ou, para piorar, não correspondiam com a doutrina do Cristo (da
qual me dizia seguidor) ou com ela não fazia sentido...
Achei-me hipócrita,
falso, covarde porque meu comportamento jamais demonstrava que era eu uma pessoa
que pensava e sentia daquela forma. Lutava, e lutava, e lutava para que aqueles
pensamentos, julgamentos e vontades não fizessem mais parte de mim, mas quanto
mais lutava, mais aumentava a culpa por ser quem “achava” que era. Até o dia
que, sob as justificativas que eu determinei para mim mesmo, aventurei-me a
“experimentar” certas circunstâncias só para saber como era. Não queria ser
falso, hipócrita ou coisa do tipo... Queria ter “coragem” se ser alguma coisa
diferente daquilo que me incomodava, por achar que, pensando de uma forma e
lutando para agir de outra estava sendo hipócrita comigo mesmo em não ouvir
minhas necessidades, ao mesmo que pensei: porque não? Qual o erro em certas
coisas desde que você não esteja prejudicando ninguém?
Então troquei o bobo, conflituoso e reflexivo pelo arrojado,
despojado e desejável... Um sentimento de satisfação e realização batia de tal
forma que qualquer consequência seria nada mais, nada menos que oportunidades
para a autoafirmação. Aí sim, bate de frente, exponha, questione, aponte,
grite, pois o momento é seu, agora o mundo é pequeno e “você é o cara”, e não
faltam pessoas e circunstâncias que aparentemente te comprovassem isso. Até
mesmo se alguém ficasse chateado era rotulado como egoísta, incompreensivo ou
merecedor porque se eu não era santo, RÁ!: os outros também não eram... Então
está mais do que certo. Tudo e todos cada um no seu devido lugar! Não me julgue
porque “você não tem direito”. Manipulações, mentiras, desvios de conduta, tudo
muito bem alinhado com o ego, para que nenhuma culpa ou sentimentos “menores”
como medo, incerteza, apatia, tristeza, pudessem atrapalhar. Sentimentos de
gente que se acovarda por trás daquilo que “não tem coragem de viver”.
Assim, com um ego bem arvorado, determinado e resoluto, parti
para viver da forma como achava leal aos meus sentimentos, usando os mesmos
para justificar a legitimidade do que fazia... A quem não faltasse para te dar
o devido “apoio” necessário para que aquilo se concretizasse. Tudo lindo até o momento em que comecei a
perceber o que estava perdendo... A princípio pesei na balança o que estava
perdendo externamente: pessoas, coisas, ambientes, circunstâncias que eram
importantes para mim, mas que, por outras que tomaram lugar (momentaneamente, e
esqueci-me de pesar isso), comecei a abrir mão achando que eram apenas coisas
externas das quais estava apegado e que, com o tempo, novas circunstâncias
tomariam seu lugar e tudo ficaria bem, achando até mesmo que não sentiria tanta
falta. Justificava ainda alegando que vivi experiências nem sempre escolhidas
espontaneamente por mim, que abracei causas que não eram minhas, deixando de
lado as que “julgava importantes” para mim...
Graças a Deus não bastou muito tempo para começar a ter
conflitos ainda maiores: a falta de pessoas e situações começou a bater muito
forte! Comecei a me achar fraco, pois havia lido em diversos livros que
“situações novas de fato geram desconforto e é preciso adaptar-se, mas não
desistir”. Ah o ímpeto da coragem... de fato, se a circunstância não estava
boa, meu caro, nada mais justo que dispensá-la e partir para outras
experiências mais “a tua cara”, ou “que lhe tragam melhores resultados e mais
satisfação”. ÓTIMO! Tudo bem e novamente justificado, ego inflado, peito
aberto, mundo pequeno e vamos para frente!!!! Porém... começaram as lembranças
de coisas e momentos tão bons, simples, ingênuos e longe do circuito de
situações que mechem muito com as sensações e os prazeres mais “aguçados” (ou
menos aguçados e mais envolventes)... um lado homem falando mais que o macho
(até então o pensamento era inverso), um lado mais sensível, puro e longe de
bajulações ou exaltações a sua vaidade. Não que não existissem situações a serem
resolvidas, alinhadas, “colocados os pingos nos ís”, porém o que havia de tão
bom foi desprezado, esquecido, ignorado, tudo para justificar o que o meu
“verdadeiro Eu” queria e desejava... Desde então as lágrimas passaram a ser as
companheiras sempre presentes... Angustias, conflitos, medo, incerteza, apatia,
tristeza, tudo de novo e ainda mais intenso. Peraí: não foram elas que te
levaram a agir como está agindo, a escolher as rotas que está tomando e agora
elas novamente te tomam e ainda piores? Não é possível, cara, acovardado de
novo? Era para estar se não feliz ao
menos resoluto, confiante... O que pega?
O que pegou foi perceber que tudo aquilo ainda tinha o seu
valor (e muito), e outras circunstancias que, por mais que lhe agradassem, não
preenchiam o vazio que sentia ao deitar sua cabeça no travesseiro ou buscando
um por que ou referência para aquilo que estava desejando, e não encontrar
aonde estava... Piorou quando percebeu que muita coisa eu já vivia ou nada
impediria de viver no lugar em que não estava...
Porra, cara, você não sabe o que quer da vida? Sempre
decidido, firme e agora vacilante? Essas eram perguntas elaboradas com
frequência, que aumentavam ainda mais o conflito e a vergonha perante si,
especialmente a perceber que várias razões existiam para uma tomada de postura
diferente, retomar as coisas, assumir os papéis que eram seus (e não achava que
era), tomar o lugar que era seu, e de direito (mas achou que não havia sido
construído por você e sim pelo desejo dos outros), cobrar de quem tinha que
cobrar e questionar quem tinha que questionar (mas que nunca se achou digno
devido aos seus conflitos, por ter deixado há desejar um dia, por sentir-se
hipócrita, e um monte de outros achismos). Tudo perfeito, raciocínio acurado,
resoluções tomadas internamente, visão clara das coisas... Ah! Tudo pronto para
uma mudança... mas... O que eu faço com tudo aquilo que vivenciei e foi tão bom?? Como chatear novamente pessoas (mesmo dentro da sua razão), na
verdade era o ego louco para ser aceito, amado, com sua vaidade sendo colocada
nas alturas, que delícia... Como dispensar tudo isso? Mas faltou afirmar uma
pergunta para responder a outra: mas em prol do que seria???
Começa aí um jogo desgastante de emoções, situações,
pensamentos e mais pensamentos repetitivos, persistentes e até em alguns
momentos maldosos, ou que buscavam a todo o tempo uma fórmula mágica de sair de
tudo isso de forma a não sofrer consequências ou rejeições, e, por fim, mas
mentira, manipulação, ego, orgulho, e etc.
A dor que antes era do que acha que não era, hoje, nesse
processo de mudança e retomada (de mim e daquilo que é importante) que ainda
continua, agora é daquilo que eu
estava me tornando, e hoje vejo que muito do que eu julgava como
hipocrisia era nada mais que o melhor de mim lutando contra aquilo que, apesar
de desejar, sabia que não agregaria em nada, que o que me condenava ou que
queria abrir mão em função do outro era o melhor que havia em mim, como disse
Oswaldo Montenegro em “A lista”: quantos defeitos sanados com o tempo/era o
melhor que havia em você!
Percebo que o maior erro foi lutar contra o que eu não
queria, ao invés de focar naquilo que queria...
Que o momento em que deveria ter tido mais paciência era com
as mudanças que estavam ocorrendo nos conflitos, e enxergar os benefícios que
eles estavam me trazendo como amadurecimento, resiliência, experiência,
oportunidade de ajudar o outro, resistência moral...
Que as brigas que comprei achando que não eram minhas,
deveria dar graças a Deus que “não eram minhas”, ou seja, não fui ei quem as
criou (pelo menos naquele momento ou existência), que eu estava ali para
AJUDAR, COLABORAR, EXEMPLIFICAR, enfim, servir de suporte, mas sem colocar tudo
aquilo como um peso...
Faltou experiência, manter a visão do que acreditava, afirmar
ainda mais as minhas convicções, arrumar um “boa briga” com aqueles que amava
ao invés de justificar meus atos através dos deles, enfim, quanta coisa e
quantas emoções e situações vividas desnecessariamente... Tudo o que vivemos e
fazemos é aproveitável em matéria de evolução, porém nem tudo precisava ser
como foi...
Hoje não existem culpados pelo que fui e sou. Alguns acham
que colaboraram com o meu progresso, permitindo viver comigo certas experiências e me influenciando para as mesmas, onde na
verdade também, usaram da minha fragilidade para obterem o que queriam: um
momento, um prazer, a sensação de se sentir melhor por ver alguém perdido e
desequilibrado, enfim... E isso também me atormentava e tentava rotular essas
mesmas pessoas de forma a me sentir melhor pelos sentimentos que estava
nutrindo por elas o que queria nutrir para ter uma justificativa e me afastar,
ledo engano novamente, tomando o efeito pela causa, me acovardando diante do
que deveria fazer e não fiz... Outras pessoas achava que queriam me manter por
perto e aconselhar em função de seus interesses, contudo vejo que me ajudaram e
me amaram de verdade, mesmo quando não estava sendo para elas (e para mim
mesmo) o que deveria e mereciam...
Ainda mantive certas coisas, outras perdi... Talvez não
recupere mais ou possa vivê-las um dia, mas em verdade e de forma sublimada,
com respeito a minha dignidade e das pessoas...
O mais importante é que tudo caminha para o melhor, e que,
por mais que ainda muitas dores e apegos sejam pungentes, novos horizontes se
descortinam dentro e fora de mim, trazendo experiência, autoconhecimento....
O hipócrita que achava que era antes retorna, mas consciente
da sua hipocrisia e de suas limitações...